terça-feira, 20 de maio de 2008

Sinos.

O Noivo.
Estando de picuá cheio, e a coceira de estimação nas canelas.
Estado de graça, quase sono.
De caderneta limpa em venda, quitanda e casa de umbanda.
De nome bem-dito, selado qual seu lazão. Era partido de dar gosto, de encher baú de enxoval de qualquer florzinha da cidade.

Estátua de sal, a Noivinha arredia.
Haveria de se casar com a promessa, não com o prometido.
Destempero contido, quase acordar.
Menina enjeitosa, de anca fina. Não daria pra herdeiro homem.
Sabia-se que sempre acamada, o sangue afina, o leito esfria.
De pai dono de terreiro, de mucama e acompanhante.

O Velho.
De engenho e espiga guardava o sobrenome do pai.
Qual sua farinha, a filha era barganha antiga. Já eram quinze anos esperando a hora da menina.
De mormaço nas ventas, alerta de nunca dormir.
Da viuvez, ganhara a secura dos olhos. Agora ganharia o herdeiro que não teve, no altar.
Sabia que preto que enriquece tem que manter curta a paciência.

Padre, arroz e festa.
Caminho de casa, fazenda de porvir.
Pasto duro de engolir sem o bálsamo de paixão, de encanto que fosse.
Passaram a vida em silêncio.
E silêncio não é companhia mansa.
Arredia, intromete, salga.
E isso não é bom pra negócios de papai.

A Família.
Em décimo de século, silêncio.
A novos rebentos não brindaram, a morte do velho quase não choraram, o genro não aprendeu a trabalhar.
Gastou o pingo de saúde da Noivinha, gastou o nome do Velho, gastou a canela de tanto coçar.
O engenho parou, tamanho o desamor de Noivo. E, afinal, não havia nenhum sucessor para o Velho.
O terreiro teve de ser fechado, tamanhas as dívidas. E, afinal, não havia nenhum sucessor para o Velho.

De tudo, e do Velho, só restou o dito que se espalhou pela cidade;

‘Dente gasto que não é trocado, dói o engenho, faz farinha que desanda bolo.’